quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

As bases filosóficas da Ikebana: o Bushidô

A dedicação a uma arte como forma de desenvolvimento pessoal é um dos traços da ikebana que podem ser associados ao Bushidô. O termo, que significa o Caminho do Guerreiro, foi introduzido no Ocidente por Nitobe Inazô, autor japonês que se casou com uma estadunidense, mudando-se para a Filadélfia. Em 1899, Inazô lançou o livro Bushidô: A Alma do Japão (Bushidô: The Soul of Japan), que se tornou um bestseller. É claro que o registro da admiração por algumas das características da classe guerreira, como o domínio da arte da espada, aparece bem antes, ao redor do século 8 d.C.

Do xintoísmo, o bushidô herda a devoção aos antepassados e a lealdade ao senhor feudal e ao imperador. O traço humanista, com o esforço de aperfeiçoamento moral e social, viria do confucionismo. Charles Moore, em Filosofia: Oriente e Ocidente, lembra que Confucio (551-479 a C) foi um grande organizador social, tendo uma proposta de aplicação muito prática de seus ideais: “Quando o pai é pai, o filho é filho, o irmão mais velho é irmão mais velho, o marido é marido e a esposa é esposa – então a família está na ordem adequada, tudo estará bem no mundo (p. 296). No capítulo História da Filosofia Chinesa, da mesma obra, o ex-professor de filosofia chinesa no Dartmouth College, Chan Wing-tsit, explica que para o pensador chinês o ser humano vinha em primeiro lugar.

A partir deste núcleo estruturante, o resto seria consequência. Segundo Confúcio “quando as coisas forem inteiramente investigadas, o conhecimento se estenderá ao máximo. Quando o conhecimento se estender ao máximo, as nossas ideias se tornarão verdade. Quando as nossas ideias se tornarem verdade, nossas mentes serão retificadas. Quando nossas mentes forem retificadas, nosso caráter individual será melhorado. Quando nosso caráter individual for melhorado, nossa família será bem ordenada. Quando as famílias forem ordenadas, o Estado será bem governado. Quando os estados forem bem governados, todo o mundo estará em paz” (p. 297).

O Bushidô consolida-se no século 12 e, no 17, ocorre um marco: com o xogunato dos Tokugawa, em 1603, o título de samurai passa a ser transmitido de pai para filho. Era o fim da mobilidade social nesta classe social. Do século 16 ao 19, período considerado pacífico nas ilhas japonesas, os ideais da bravura acima da própria vida, lealdade e obediência ao dever, ao governante e à pátria são enfatizados. Na ausência de guerras, os samurais dedicam-se às artes, entre elas a ikebana.

A grande reforma realizada na era Meiji (1868-1912) põe um fim à classe dos samurais, que é abolida em 1876, quando é criado um exército nacional ao modo do Ocidente. As espadas (katanas)são retiradas, bem como o status social e os honorários governamentais. Com isso, entra em declínio a tradição e os valores dos samurais – queda que está registrada no Ocidente no filme O Último Samurai (2003), estrelado pelo astro hollywoodiano Tom Cruise. Resta o espírito de honra destes guerreiros, que em alguma medida ainda permeia a cultura japonesa até os dias atuais.

Texto: Monica Martinez

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